Dirceu Ayres
Para cientista político da FGV, maioria da presidenta é mais confortável que a de seu antecessor. Mas heterogeneidade dos partidos que a apoiam dificulta definição da pauta e a faz enfrentar instabilidade maior que Fernando Henrique. Professor analisou pesquisa encomendada pelo Congresso em Foco Com maioria mais ampla, Dilma vive situação mais confortável que a de Lula. Mas heterogeneidade da sua base a torna mais instável do que era a de Fernando Henrique - Roberto Stuckert Filho/Planalto Melhor que o petista Lula, pior que o tucano Fernando Henrique Cardoso. Para o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) Márcio Grijó Vilarouca, assim pode ser resumida a situação da presidenta Dilma Rousseff (PT) em relação à sua base governista. Na avaliação do cientista político, o grande número de partidos com perfis distintos que integram o bloco de sustentação da presidenta no Congresso garante a ela, por um lado, folgada maioria. Mas, por outro, dificulta a definição de uma pauta pelo Executivo. “Comparativamente, a situação da Dilma é melhor que a coalizão do governo Lula, que não tinha maioria no Senado. Mas é pior que a do Fernando Henrique, que tinha uma coalizão mais enxuta, de centro-direita. Com Dilma, são dez partidos heterogêneos, com um elevado número de atores para a coalizão. Não é simples levar adiante uma agenda de governo. É um problema satisfazer a diversidade de partidos de espectros ideológicos diferentes”, observa. Em seus dois governos, Fernando Henrique Cardoso teve o apoio do PSDB, do PFL (atual DEM), do PTB, do PPB (atual PP) e de parte do PMDB, partidos que lhe garantiram maioria nas duas Casas legislativas. Com um leque maior de legendas em torno de si, Lula manteve-se com folga na Câmara, mas enfrentou ferrenha oposição no Senado ao longo de seus oito anos de governo. Um problema que não existe para Dilma, com sua ampla maioria entre deputados e senadores. Márcio Vilarouca analisou os dados levantados pelo Instituto Análise, em pesquisa encomendada para a Revista Congresso em Foco, publicada por este site. Na visão dele, as respostas dadas pelos 150 parlamentares entrevistados revelam um Congresso bastante fragmentado e ciente de seu pouco poder decisório.A reboque De um lado, uma oposição fragilizada e sem discurso; de outro, uma ampla e heterogênea base governista, que busca conciliar as divergências entre partidos que vão da esquerda à direita. De acordo com o professor, emerge da pesquisa um Congresso que admite ir a reboque do Executivo em função de sua pouca capacidade de definir a própria agenda. O cientista político entende que Dilma tem condições de fazer uma agenda política. Mas não com a pauta pretendida pelo PT. “O nosso sistema tem uma alta fragmentação partidária e implica um perfil mais moderado, uma agenda que avança mais devagar e de maneira mais consensual. Como Dilma tem maior número de atores envolvidos, ela terá de buscar sempre o meio termo”, acrescenta. O cientista político avalia que o índice de deputados e senadores que aprovam a forma com que o governo tem atendido às demandas dos parlamentares é “razoável”, sobretudo, por causa da heterogeneidade e do tamanho da base aliada. “Pouco mais de um terço diz que o governo tenta lidar com as demandas da base. Outros 13% dizem que o governo não tem conseguido, mas tenta. Quase metade entende que Dilma tenta lidar com divergências na base. Só 19%disseram que o governo não tem atendido. É um nível razoável de aprovação, porque faz parte do jogo você mostrar descontentamento para conseguir um naco maior.” Conflito interno Com uma oposição enxuta, destaca o cientista político, é natural que o governo enfrente mais conflitos em sua própria base do que na oposição. Para ele, o número de ministérios nas mãos do PT hoje é desproporcional ao tamanho da bancada e abre caminho para a insatisfação dos aliados. “No gabinete inicial, eram 17 ministros do PT e seis do PMDB. O PSB tinha dois, o PP, o PDT e o PCdoB tinham um cada. Isso gera conflito dentro da base. Nos governos europeus parlamentaristas, a participação dos partidos nos gabinetes depende do número de votos que cada legenda recebeu. É um problema satisfazer a diversidade de partidos de espectros ideológicos diferentes”, considera. Se o governo tem dificuldade em estabelecer uma agenda positiva, por causa da diversidade de sua base, a oposição esbarra no dilema de construir um discurso que resista ao sucesso da economia, a despeito da crise que se avizinha. Ou seja, de fazer sustentar uma agenda negativa. Oposição perdida “Qual a agenda da oposição hoje? Não tem. O fato de o país estar em um bom momento econômico dificulta uma agenda mais negativa. A oposição tem dificuldade de estabelecer uma agenda para se diferenciar do governo. Como a economia está indo bem, fica difícil estabelecer essa contra-agenda. Às vezes, os temas são distantes da população. Os temas apropriados pelo PT na oposição tinham mais apelo do que a reforma tributária, por exemplo.” Márcio Vilarouca acredita que esse cenário econômico favorável explique por que a presidenta Dilma aparece hoje como favorita para as próximas eleições presidenciais, na avaliação dos parlamentares. “Se a economia está indo bem, a probabilidade de reeleição é muito alta. Se daqui a três anos a economia estiver bem, é muito provável que Dilma se reeleja”, afirma. O cientista político diz ter ficado surpreso com o fato de o ex-candidato tucano José Serra não ter sido lembrado uma vez sequer pelos parlamentares, nem mesmo por seus colegas de partido. Para ele, isso mostra que, embora não possa ser dado como carta fora do baralho, Serra ainda está pagando pelos erros cometidos na eleição passada, quando foi acusado por aliados de centralizar as decisões de sua campanha e de não saber negociar apoio nos estados. Nome mais cotado pela oposição para a sucessão presidencial, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) encarna uma imagem diferente, segundo o professor. E talvez por isso, acrescenta, seja o mais lembrado. “O nome dele aparece com 21%da preferência na oposição, enquanto o nome do Serra simplesmente não aparece. Serra tem uma imagem de muito confronto com o PT e com Lula. O Aécio, como bom mineiro, faz uma plataforma mais moderada. Isso ajuda a organizar uma imagem nova para a oposição. É difícil fazer oposição só com agenda negativa quando você tem crescimento econômico.” Carta na manga Para Márcio, é natural Dilma aparecer à frente de Lula na pesquisa feita entre os parlamentares sobre quem estará no comando do país em janeiro de 2015. Isso só vai mudar, acredita, se a crise econômica internacional desembarcar de vez no país. “Se o cenário econômico se mantiver, ela tem boas condições de se reeleger. Se ficar mal, o PT tem outra carta na manga, que é o Lula. É uma questão estratégica. Não há porque usar agora a carta que pode ser usada mais adiante.” O professor observa que, apesar de apontarem para a reeleição de Dilma, os parlamentares ainda preferem Lula. O ex-presidente recebeu de deputados e senadores a maior nota entre sete instituições e personalidades. “Lula soube negociar mais com o Congresso do que Dilma. Ela não tinha uma socialização política, coisa que nele sobrava. Dilma tem um perfil mais técnico.” Os parlamentares deram nota, de zero a dez, a quatro instituições e três personalidades. Destas, a mais bem avaliada foi Lula, com média de 7,25. Na pesquisa, realizada antes da revelação de que ele tem câncer de laringe, o ex-presidente se saiu bem inclusive na análise da oposição. Somente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a imprensa receberam notas melhores dos deputados e senadores oposicionistas.
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