domingo, 16 de setembro de 2012

Com 62% das obras finalizadas, refinaria de Lula custa dez vezes mais. E Chávez não botou nenhum tostão na obra.


  
     Dirceu Ayres

Foi perfeita a armadilha montada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a plena concordância da diretoria anterior da estatal, para tornar a Petrobrás refém dos interesses políticos e das irresponsabilidades administrativas do presidente venezuelano, Hugo Chávez, por meio da associação - por enquanto apenas no discurso político dos dois governos - da empresa brasileira com a estatal venezuelana de petróleo PDVSA. Para alimentar seu delírio megalomaníaco de se transformar em grande líder político regional, o ex-presidente não hesitou em utilizar recursos do Estado brasileiro para auxiliar governantes que poderiam fazer parte do grupo que pretendia liderar, como os da Venezuela, Equador, Paraguai (na época governada por Fernando Lugo) e Bolívia. Do ponto de vista político, o projeto de liderança do ex-presidente pode ter- lhe rendido algumas vantagens. Do lado econômico, porém, além de perdas para empresas brasileiras prejudicadas por atos lesivos aos interesses do País praticados por governos chefiados por supostos aliados de Lula, o projeto de liderança política regional do ex-presidente está tendo consequências danosas para a Petrobrás. O acordo de associação entre a Petrobrás (com 60%) e a PDVSA (com 40%) para a construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, foi assinado por Lula e Hugo Chávez em 2005. A refinaria foi projetada para processar óleo venezuelano e óleo do Campo de Marlim, na Bacia de Campos, em partes iguais. O fato de, durante décadas, a Petrobrás não ter ampliado sua capacidade de refino, tornou a obra urgente. Iniciada em 2007, a construção foi orçada em R$ 4,75 bilhões. Mas, devido a atraso e a estudos incompletos, a obra foi ficando cada vez mais cara e a previsão de custo mais recente já alcança US$ 20,3 bilhões, ou cerca de R$ 41 bilhões, quase dez vezes a estimativa inicial. Com previsão de inauguração em 2014, a refinaria está com 62% das obras executadas. Mas a Venezuela ainda não pôs um centavo na obra, o que demonstra desinteresse e desrespeito ao acordo de 2005. Mesmo sem garantias de que a sócia cumpriria sua parte, a Petrobrás, na gestão anterior chefiada por José Sérgio Gabrielli, comprou praticamente todos os equipamentos necessários para o refino do petróleo venezuelano, com teor de enxofre bem mais alto do que o óleo de Marlim. A explicação dada pela empresa para a antecipação da compra desses equipamentos foi a necessidade de "garantir prazos em função do aquecimento do mercado fornecedor de bens e serviços na ocasião". Quaisquer que tenham sido as razões, o certo é que essa antecipação contribuiu para encarecer a obra. Isso significa que, com ou sem a parceria da PDVSA, a Refinaria Abreu e Lima utilizará metade de sua capacidade instalada para processar petróleo com alto teor de enxofre. Se não obtiver esse óleo por meio da parceria, terá de comprá-lo no mercado externo, onde uma das únicas fornecedoras é a própria PDVSA, que certamente fornecerá o produto a preços de mercado, sem nenhuma vantagem. A Petrobrás está sendo refém da PDVSA, que continua a afirmar sua intenção de cumprir sua parte na sociedade na construção da refinaria, e, quando esta iniciar suas operações, continuará a ser, pois dependerá do petróleo a ser fornecido por ela. Sem poder salvar a empresa da armadilha criada por Lula ao associá-la com a PDVSA, a presidente da Petrobrás, Graça Foster, diz-se disposta a conceder novos prazos para a venezuelana honrar seus compromissos. "Eles precisam fazer parte desse projeto", disse no Senado. Tendo a aventura lulista avançado tanto, a solução menos ruim talvez seja, de fato, manter a PDVSA como sócia. A estatal venezuelana vem adiando seguidamente a apresentação das garantias reais exigidas pelo BNDES para a concessão de um financiamento de US$ 4 bilhões que lhe permitiria cumprir parcialmente seus compromissos na sociedade. O novo prazo termina em novembro, mas, mais uma vez, a PDVSA poderá se valer da notória dependência da Refinaria Abreu e Lima do seu petróleo para continuar ganhando tempo. (Editorial publicado hoje no Estadão)

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