terça-feira, 26 de abril de 2011

MINHA INFÂNCIA

                                                  
                                    Dirceu Ayres
Estava para completar os 12 anos quando minha mãe enfim realizou seu sonho de ir morar numa pequena cidade do interior. O quintal parecia ter sido varrido há mais de dois meses, depois da última visita, mas as mangueiras estavam de pé: o cajueiro, as goiabeiras, jaqueiras que eu curtia desde minha tenra infância, a figueira, e a moita de bananeiras onde nos escondíamos para fugir dos castigos de minha mãe, tudo estavam como antes. Durante o dia, eu ainda moleque, subia em árvores, brincava novamente de bandido e mocinho. Fugíamos meus irmãos e eu, mais os filhos da vizinha, para tomar banho no rio Camaragibe, empreendíamos nossas caçadas aos morcegos que habitavam o grotão e fumávamos cigarros de talo de mamona que na época nós conhecíamos como carrapateira, Isso tudo é conhecido de todos que tenham vivido ou passado férias no interior. Andando de uma ponta a outra da praça e refazendo dezenas de vezes o mesmo trajeto. Há certa hora os sinos da Igreja Matriz chamavam para a novena. Se fosse sábado, iam rapazes e moça depôs dos serviços Paroquiais dançarem no clube; meus amigos e eu, ainda muito novos para bailes, nos contentávamos com passar pela sorveteria antes de voltar para casa. Sentada em uma cadeira de balanço, com seu eterno crochê e um chalé desbotado e muito gasto pelo tempo de uso, minha avó cantava dolentes e antigas modinhas sertanejas, e cantigas de roda cuja origem se perdia no tempo, ou contava histórias de família, das quais eram cuidadosamente expurgados os fatos referentes à origem do sobrenome. Mas emocionantes mesmo eram os causos de Lampião: Desmandos de coronéis, feudos que dividiam a população local em dois partidos, a morte do grande Delmiro Gouveia, abatido a tiros de arma de fogo quando passava em frente à casa de um desafeto. Aquele era o homem que havia levado água e mais dignidade para aquele povo sofrido. Montou e fez funcionar uma usina hidroelétrica e uma Fábrica de tecidos para dar mais avanço aquele povoado. Era um empreendimento muito caro custoso e audacioso para aquela época e numa cidade tão pequena. A pequena cidade que no início chamava-se... PÉDRA, só muito depois passou a usar o nome de DELMIRO GOUVEIA.  Mais para aquele homem nada parecia impossível, era um empreendedor, já nasceu assim com uma coragem de trabalhar imensa somada a uma inteligência superior que o tornou uma máquina de trabalhar constante, isso somado a força de trabalho do sertanejo só podia significar evolução e tudo acabou naquela emboscada. Nós meninos assustados com os acontecimentos procurava-mos nos distrair de várias maneiras. Desfolhávamos mal-me-queres, fazíamos todo tipo de simpatias para desvendar que futuro estava reservado aos nossos amores. "Minha namorada", a bela moça, era filha do italiano dono da papelaria e desfilava pela cidade sempre em seu cavalo alazão. Estivesse eu onde estivesse dentro de casa, ao ouvir o ruído de alguma marcha ou trotar de algum cavalo, corria para a janela, e, por trás das venezianas, aguardava com o coração aos pulos, para ver se era "ela". Vê-la passar, era o bastante, nisso se resumiu o nosso namoro, aliás, apenas aquele é que seria mesmo meu namoro. Agora só tenho a lembrar constrangido o tempo que eu era feliz e nem sabia, más como atualmente estou vivendo somente de recordações, não vou reclamar, isso me basta, serve para lembrar que guardo lembranças e tive INFÂNCIA, as meninas lindas que aceitavam me namorar e das quais até hoje guardo boas lembranças.

Nenhum comentário:

Postar um comentário