sexta-feira, 20 de maio de 2011

MAIORIDADE PENAL E HIPOCRISIA

                                                       Dirceu Ayres
Toda vez que um menor comete um crime repugnante (homicídio, estupro, latrocínio), volta o debate sobre a maioridade penal. O essencial mesmo sendo dito e repetido muitas vezes, nada acontece. Aos poucos, o horror do crime vai sendo esquecido. Não é por preguiça, não senhor, é por hipocrisia mesmo. Preferimos deixar para lá, até a próxima vítima que será covardemente assassinada, digo, covardemente, porque custamos a contrariar alguns lugares-comuns de nossa maneira de pensar. A prisão é uma instituição hipócrita, cheia de hipocrisia por parte dos que a administram e isso é desde sua invenção. Ela foi criada para proteger o cidadão mesmo sendo perigoso, evitando que os lobos o devore na jaula ou na rua, e pune o criminoso, constrangendo seu corpo. Mas nossa alma “generosa” dorme melhor com a idéia de que a prisão é um empreendimento reeducativo, no qual a sociedade cuida de suas ovelhas soltas ou desgarradas. A versão nacional dessa hipocrisia diz que a reeducação falha porque nosso sistema carcerário é brutal e inadequado. Essa caracterização é exata, mas qualquer pesquisa, pelo mundo afora, reconhece que mesmo o melhor sistema carcerário só consegue “recuperar” (eventualmente) os criminosos responsáveis por crimes não-hediondos. Quanto aos outros, a prisão serve para punir o réu e proteger a sociedade. Em geral, para evitarmos admitir que a prisão serve para punir e proteger os delinqüentes, e não para educar, muda-se o foco da atenção: “Esqueça a prisão, pense nas causas”. Preferimos, em suma, a má consciência pela desigualdade social à má consciência por punir e segregar os criminosos. Ora, a miséria pode ser a causa de crimes leves contra o patrimônio, mas o psicopata, que estupra e mata para roubar, Não é fruto da dureza de sua vida ou da que ele sempre levou em família ou fora dela. Por exemplo, no último número da “Revista de Psiquiatria Clínica” que lí (vol. 33, 2006), uma pesquisa de Schmitt, Pinto, Gomes, Quevedo e Stein mostra que “adolescentes infratores graves (autores de homicídio, estupro e latrocínio) possuem personalidade psicopática e risco aumentado de reincidência criminal, mas não apresentam maior prevalência de história de abuso na infância do que outros adolescentes infratores”. A má consciência por punir e segregar é especialmente ativa quando se trata de menores criminosos, pois, com crianças e adolescentes, temos uma ambição idiota e desmedida: queremos acreditar que podemos educá-los e reeducá-los, sempre e rapidamente. A “Revista de Psiquiatria Clínica” (vol. 31, 2004), Jorge Wohney Ferreira Amaro publicou uma crítica fundamentada e radical do Estatuto da Criança e do Adolescente. Resumindo suas conclusões: Em suma, a maioridade penal poderia ser reduzida para 16 ou 14 anos, mas não é isso que realmente importa. A hipocrisia está no artigo 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo o qual, para um menor, “em nenhuma hipótese, o período máximo de internação excederá a três anos”. Ora, a decência, o bom senso e a coerência pedem que uma comissão, um juiz especializado ou mesmo um júri popular decidam, antes de mais nada, se o menor acusado deve ser julgado como adulto ou não. Caso ele seja reconhecido como menor ou como portador de um transtorno da personalidade, o jovem só deveria ser devolvido à sociedade uma vez “completado” seu desenvolvimento ou sua cura -que isso leve três anos, até os 50 anos se for preciso. Legilasdores, homens que sabem o que é a dor de perder um parente façam alguma coisa e tome atitude acertada.

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